No
alto de uma falésia a beira mar, ergueu-se uma capela chamada de Nossa Senhora
das Pedras. Era o ano de 1763, no litoral sul da Paraíba. Contam que um navio
português quase naufragou naqueles mares e a capela foi construída, em
agradecimento, pelos sobreviventes.
Hoje
o nome mudou para Nossa Senhora da Penha e uma igreja maior foi construída, ao
lado, para receber os peregrinos que fazem longas caminhadas movidos pela fé e
devoção à santa. Mas a pequena capela continua lá, singela e fresca, com vista
para o mar.
Passei
lá outro dia. Estava vazia; o sol forte, a vista bela, muitos avisos de não
acender velas e muitas velas acesas a iluminar os avisos. Andei pelos arredores
e encontrei uma casa, portas e janelas abertas, nome escrito na fachada : casa
dos milagres.
Entrei
num salão bem grande, com três bancadas enormes, duas nos cantos e uma no
centro. Vi primeiro a do centro, cheia de casas. Miniaturas. Umas pequenas,
outras maiores, de papelão, madeira, com varanda, chaminé, outras de um cômodo
só ou de quatro quartos. Empilhadas. Feito favela no morro, escalavam umas às
outras, se segurando e equilibrando não sei como. À minha direita, muitas
próteses, pernas, braços, cabeças, mãos de cera , uniformes de policial,
avental de enfermeira. À esquerda, muitas fotografias, centenas. Uma me chamou
atenção . Era uma propaganda eleitoral de uma candidata a vereadora. Eleita;
fiquei sabendo depois.
Incontáveis
milagres, histórias de dor e superação ali expostas para meu espanto e certo
incômodo. Restos da fé.
Enquanto eu olhava com curiosidade cada peça e
imaginava seus segredos, uma senhora entrou trazendo pequeno objeto, que
depositou junto às casinhas. Olhei. Era uma pérola. Ela saiu se dirigindo à
capela para rezar. Segui-a. Fiquei do lado de fora. Assentada numa pedra na
encosta eu olhava o mar em seu infinito azul e me perguntava sobre aquele
objeto, tão inusitado, deixado na casa dos milagres. Uma casinha lá deixada
dava para entender...remetia à aquisição de uma moradia, pelo devoto; se
financiada pelo Minha casa, minha vida, então, verdadeiro milagre! Uma perna de
cera também podia resultar da cura de alguma erisipela no
precário hospital municipal- outro verdadeiro milagre!
Mas, e a pérola?
Escutava
o barulho das águas se arrastando nas pedras quando a senhora, tendo acabado
sua reza, assentou-se ao meu lado. Olhei-a como uma interrogação e ela, com
serenidade, me disse: quando entra um grão de areia ou outra substância
indesejável no interior da ostra, as células de nácar começam a trabalhar e
cobrem o grão de areia com camadas para proteger o corpo indefeso da ostra.
Esta ferida cicatrizada é a pérola! Joia
feita de trabalho, de bordado da dor. Assim aconteceu comigo.
A água do mar espumava seu riso, a prata
do entardecer se derramava no infinito, sua mão se abriu em concha e nos
cumprimentamos com emoção.