Eu estava em Amsterdã no ano de 2001. Fui visitar a casa onde Rembrandt havia morado. Muita emoção me cercava ali.Eu admirava as obras deste pintor holandês do séc. XVII.Havia feito um curso sobre a arte e pintura holandesa barroca.Tudo o que queria era estar ali entre os brocados, os tecidos, o claro-escuro, o dourado, as sutilezas e delicadezas das obras de Rembrandt.Queria ver sua casa, sua cama, seu atelier, as escadas onde havia pisado, os objetos que havia tocado, as intimidades que havia compartilhado. E ali estava eu como puro sonho.
Entrei na casa estilo sobrado holandês e, logo no hall, parei estupefata diante da cena! Havia uma mesa-gaveta com tampo de vidro e dentro um prato, uma caneca e uma colher dispostos displicentemente dentro da gaveta. Meu olhar deslizou para a parede e, logo acima, os mesmos objetos - prato, caneca e colher - pertenciam a um quadro pintado e pendurado acima. Mesmas cores, mesma textura, mesma ocupação de espaço, mesma displicência, mesma singeleza agora em duas dimensões.
A duplicidade daquela cena, a pureza, a simplicidade me encontraram num tal estado de comoção que comecei a tremer, a chorar, a me extasiar diante daquilo que me devolveu à minha própria infância e seus objetos. Objetos de minhas refeições em família, objetos de minhas brincadeiras com minhas bonecas. Dar de comer a elas, fazer comidinha, picar o mato e misturar o barro, acender o fogo de mentirinha, arrumar a mesa, a boneca no colo, o prazer da sopa quentinha e saborosa, os braços de minha mãe. Objetos capturados do naufrágio daquele navio onde viajavam minhas melhores lembranças. Objetos já enferrujados e carcomidos, mas resgatados em sua plena emoção.
E me assustei quando alguém me tocou a face e disse:
-Você está bem?O que aconteceu?
Eu acordei como de um sonho.Me refiz rapidamente, e disse:
- Menina, não entendi nada! Foi pura emoção!
Márcia Sartorelo Carneiro.
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